sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Estômago


Fiquei cheio de dúvidas quando terminei de assistir este filme, pois tinha lido em vários lugares que esse tinha sido o melhor brasileiro de 2008 e um dos 20 melhores lançamentos do ano! (?)

O que será que todos viram que eu não vi?

O que vi é um filme que fala sobre o instinto animal que há no ser humano, o problema é que aqui só há o animal excluindo completamente o ser humano de racionalidade. No filme todos nós somos animais irracionais de almas podres vivendo presos em ambientes degradantes.

Entendo que o humor simples tenha feito muitas pessoas rirem, o que é ótimo, uma tentativa de se encontrar com público. “Estômago” não é cinema autoral, foi construído para as massas, e esse é seu principal trunfo, pois pode ser lido em vários níveis; tanto é uma comédia despretensiosa com personagens caricaturais como é uma análise sobre a natureza humana, e sem uma coisa atrapalhar a outra.

O personagem principal demonstra ser uma pessoa incapaz de raciocinar além de seus instintos. Ele não tem controle de nada, é levado pela situação e sempre responde a ela de forma inconsciente, inconseqüente e/ou com violência.
Faz qualquer coisa para ter onde dormir e o que comer e não faltam pequenas tiradas humorísticas onde ele demonstra sua falta de capacidade de raciocínio. Nonato, o personagem principal, não consegue racionalizar, não consegue lidar com as grandes dificuldades da vida, sentimentos mais complexos. Quando se depara com algo assim sofre absurdamente além de tudo. Sua única forma de lidar com situações complicadas é a violência, essa é a única forma possível, pois desde sempre a violência esteve presente no seu cotidiano, e somente ela.

Mesmo com a sua falta de raciocínio ele consegue fazer coisas surpreendentes como “mudar de posição social”. Na prisão ele ganha a admiração do dono da cela, Bugiú (o nome já diz, um homem-orangotango que consegue tudo o que quer na base da violência) e aos pouquinhos com o seu talento como cozinheiro ele vai melhorando de posição dentro da cela, começa dormindo no chão, vai para o beliche de baixo, depois para o meio. Mas ele quer mais, não sabemos por que ele quer mais, ele apenas quer sem nenhuma razão justificável (irracional). Ele quer dormir no beliche de cima por que é melhor, e ponto! Para isso mata Bugiú, toma seu lugar, crime sem castigo. Viva o assassino! Viva a ignorância! Viva o absoluto!

Ao terminar de ver o filme a idéia que mais me perturbou foi a de que se você tem uma pessoa que perturba a sua vida, uma pessoa que de alguma forma você nutre uma inveja por ela, mas você não consegue vencê-la pela razão, mate ela envenenada ou de alguma forma que não descubram que foi você o culpado. Seja “esperto”! Seja “ligeiro”! Faça tudo no “jeitinho”. Pois vale a pena.

(!)

E não se trata só do personagem principal, todos os personagens são animalescos. Não há fuga da ignorância. Como se nós vivêssemos literalmente em uma selva. O filme afirma que evolução não é uma questão de inteligência e sim um processo natural incontrolável. Ganhamos mais pela força do que pela razão. Mas será que é isso mesmo? Claro que não!

O filme fala da pessoa comum¹ para a pessoa comum, será que essa pessoa comum que viu o filme tem consciência do que acabou de ver? Qual será o efeito dentro do cérebro da pessoa que acaba de ver este filme como meio de diversão? Será que ela se dá conta, mesmo que inconscientemente, de sua condição animal? Ou será que ela fica feliz pelo ato de violência “esperta” de Nonato?


__________

1 - Aqui a pessoa comum é aquela que vê o Cinema apenas como forma de entretenimento.

Nenhum comentário: