quarta-feira, 29 de julho de 2009

"Sem essa, Aranha"




E se não existissem regras fixas para o cinema, será que o público conseguiria absorver idéias que estivessem fora de um padrão lingüístico e narrativo estabelecido há mais de 80 anos?

Assim começa o livro “Por um cinema sem limites”:

“O Cinema – “arte das evidências enganosas” - nasceu com a criação do homem, quando este cedeu uma costela à mulher, evoluiu com o mito platônico da caverna, ao ampliar a imagem e semelhança divina na consciência ancestral que desembocou no teatro de sombras chinesas onde alcançou o seu esplendor criativo, influenciando-nos irremediavelmente. Espalhou-se da Ásia para Europa graças ao empenho de mágicos e ambulantes andarilhos percorrendo feiras, circos e quermesses. Não era ainda o cinema, com carga de mesmice e redundância mal feita hoje, mas algo mágico que prefigurava e o antecedia com maior força do que a mídia atual, sob o princípio da decomposição e composição do movimento a partir de imagens-fotograma fixos

Só foi conhecer sua forma atual, a perfuração e o formato 35 milímetros, com Emile Reynaud, o genial mágico e empresários do Teatro Robert Houdini (que passaria às mãos do não menos genial, o incomparável e soberano George Mélies). Em pleno século das luzes, a invenção, provinda da fotografia conjugada a projeção de lanternas chinesas, envolveu fotógrafos, químicos, físicos, artistas-inventores, artesões mecânicos e industriais que transformaram na máquina de produção-reprodução de imagens animadas, inicialmente através do desenho, e patenteadas graças a esperteza do feiticeiro de Menlo Park – Thomas Alva Edison – e o fundador da Kodak, Georges Eastman, criador do suporte em acetato”

O cinema já existia antes mesmo da película, diz Sganzerla, e ele tem razão, CINEMA é projeção de idéias. Acho muito triste e limitado a visão que de modo geral a população tem de cinema, Hollywood. Deve-se, por algum tempo, ignorar a existência desta fábrica de dvds e suas filiais, e ver o que se faz e o que se fez no resto do mundo. Outras formas, outras cores, outras idéias, outras pessoas, outras vidas.

No cinema de Hollywood e em suas filiais espalhadas pelo mundo seus filmes precisam fazer sentido do começo ao fim, a história está hermética e corretamente fechada para que não aja dúvidas (pensamentos) por conta dos espectadores, e os espectadores gostam disso, se sentem seguros pois não precisam pensar muito para absorver o que está passando em frente aos seus olhos.

Quando tudo o que lemos (inclua a Bíblia), ouvimos e vemos (no cinema, na TV, nas revistas, no teatro) faz sentido e possui uma lógica interna tão bem marcada e correta que permeia toda a duração isso é prova mais do que concreta de que entramos numa crise existencial irremediável, pois não existe sentido na vida, então porque haveria sentido nas expressões da vida (a arte)? Se vivemos algo sem sentido e acreditamos cegamente em algo com sentido quando absorvemos esta expressão como reflexo verdadeiro da vida, pensamos: “Por que minha vida não faz sentido se no cinema a vida faz sentido?” “O que há de errado comigo?”

Eu respondo: Não há nada de errado com você, mas com certeza há algo de errado com o que você está absorvendo.

Os filmes de criação, de invenção, modernos, contemporâneos, ou mesmo pode-se dizer marginais (marginal da ignorância e da caretice virulenta que contagia a sociedade) possuem uma visão expandida desta arte que nasceu moderna e se perdeu graças ao seu imenso potencial de geração de renda, seu Karma.

“Sem essa, Aranha” fala sobre a miséria e a decadência moral e intelectual, sobre religião, sobre vida animalesca, sobre a cultura musical do povo, sobre limitação, sobre amor, sobre Brasil, a vida (documentário) se misturando com a ficção (mise-em-scène). Não existe estrutura dramática (começo, meio, fim, uma cena dependendo da outra) as cenas existem por razão própria dentre de si, e não por causa de uma continuidade lógica e entendível. É cinema fora de padrões tradicionais, Sganzerla nega todos os padrões estabelecidos não porquê ele é um garoto mal, mas simplesmente porquê ele tem visão consciente da vida.

Cinema existe para algo maior que apenas contar uma história “legal” dentro de um mundo fechado em si que exclui automaticamente o nosso (o mundo real) e que exclui a câmera e toda a vida ao seu redor, como se não dependesse dela. Cinema é o reflexo mais próximo da nossa vida. Esse cinema de contação de história é reflexo de mentes aprisionadas em convenções de um passado distante.

Você não acredita nas mesmas coisas que as pessoas da década de 10 acreditavam, nem tem os mesmo costumes, nem se veste da mesma maneira, você não escuta as mesmas músicas nem se diverte ou se relaciona com outras pessoas da mesma forma que as pessoas da década de 10. Tudo isso evoluiu, modificou-se, e o Cinema também! Porquê então você ainda só vê filmes produzidos no mesmo formato convencionado na década de 10?

As pessoas que assistem a um filme como “Sem essa, Aranha” ou qualquer outro filme diferente do padrão tradicional, e dizem simplesmente “que o filme não tem nada a ver” são genuinamente ignorantes.





3 comentários:

Dr.Gonzo disse...

Muito bom o texto hein!
Quanto aos franceses quero todos os máximos e mínimos detalhes URGENTE!!!!
Como tu não me fala disso antes?
Muito Massa!!!

Brian disse...

Cara, o teatro também não mudou muito desde Brecht. A dança, fora uns porra-loucas que se mexem que nem minhoca, também não. Música em grande parte muito menos (botar barulhinhos eletrônicos não é evolução). O cinema evoluiu tecnicamente, mas concordo que não há grande coisa relevante como linguagem desde Griffith. O que mudou foi o ritmo. Hoje absorve-se mais informação irrelevante em menos tempo. E é claro que tem muita coisa boa sendo feita ao redor do mundo. Chiar para Hollywood não faz mais sentido, já que a internet nos possibilita acesso ao cinema pelo mundo antes inacessível. Entendo que a tua birra é em grande parte com o espectador comum que ao consumir muita bosta acaba criando um circulo de consumo de merda, que afeta nosso paladar mais exigente no quesito acesso fácil (cinema, locadora, tv). Mas acho que isso sempre foi assim. Pão e circo. Agradeça a internet. E não se preocupe, o cinema como arte nunca vai morrer.

Wesley disse...

é, viva a internet e o download torrent.

mas acho q mta coisa nova é feita pelo mundo em termos de linguagem, ms como são obras q exigem q vc pense não é bem aceito comercialmente. o problema é q as pessoas não kerem pensar qdo vão ao cinema.