terça-feira, 1 de junho de 2010

Nem Palma de Ouro salva!


Apichatpong Weerasethakul, vencedor da Palma de Ouro na recém-encerrada edição do Festival de Cannes com Oncle boonmee who can recall his past lives (2010), está longe de ser uma figura fácil no circuito brasileiro. Até agora, nenhum de seus filmes estreou comercialmente no país.

Brillante Mendoza, outro cineasta que costuma impressionar em festivais, também não desembarca por aqui fora de mostras. O mesmo vale para Béla Tarr.

Nomes como os de Manoel de Oliveira, Theo Angelopoulos e Lucrecia Martel figuram em várias listas, mas preferências não são suficientes para garantir uma vaga entre as estreias da semana.

Ainda seria possível, nos dias de hoje, atualizar o espectador diante do boom de cinematografias como a chinesa, bastante destacada, nos anos 90, através de trabalhos de Zhang Yimou e Chen Kaige? E o que dizer quando Saraband (2003), de Ingmar Bergman, vai direto para o DVD? Determinadas práticas se tornaram comuns nos últimos tempos, como a de adiar indefinidamente o lançamento de um filme ou cozinhálo em pré-estreia durante várias semanas consecutivas.

Algumas produções tiveram seus lançamentos abortados, como o polêmico Climas, do diretor turco Nuri Bilge Ceylan, selecionado para Cannes em 2006; outras aterrissam com considerável atraso, como Polícia, adjetivo 2009), de Corneliu Porumboiu, vencedor do Prêmio Um Certo Olhar no mesmo festival. Não raro, o distribuidor é obrigado a segurar o lançamento com o objetivo de exibir os filmes nas grandes mostras internacionais de Rio e São Paulo.

Distribuidor da Imovision, empresa que tem lançado mais filmes independentes nos últimos tempos, Jean Thomas Bernardini aponta para diferentes quadros no Rio de Janeiro e em São Paulo.

– No Rio, os filmes independentes seguem basicamente para os circuitos do Estação Botafogo e do Unibanco Arteplex. Nenhum deles tem como absorver todas as produções.

Mesmo com a valorização do cinema romeno, tivemos dificuldade para lançar Polícia, adjetivo – informa Bernardini.

– Em São Paulo contamos com um circuito de arte maior. E eu estou à frente das salas do Reserva Cultural.

A Imovision já garantiu a distribuição no Brasil de quatro filmes exibidos no último Festival de Cannes: Des hommes et des dieux (2010), de Xavier Beauvois, Copie conforme (2010), de Abbas Kiarostami, Poetry (2010), de Lee Chang-dong, Tournée (2010), de Mathieu Almaric, e Film socialism (2010), de Jean-Luc Godard.

– Nosso plano é lançá-los no primeiro semestre de 2011 – anuncia Bernardini. – Queremos trazer ao Brasil os diretores e, pelo menos, um ator de cada filme.

Um dos programadores do Estação Botafogo, Alberto Shatovsky não esconde certa nostalgia ao abordar os critérios de distribuição nestes novos tempos.

– Nunca esqueci o fascínio ao ver Peau d’âne (1970), de Jacques Demy, no Cinema 1, na primeira metade da década de 70 – evoca, trazendo à tona o aconchegante cinema da Av.

Prado Junior. – Acho que o público de cinema diminuiu e perdeu o encantamento. As pessoas internalizaram uma espécie de agito.

Shatovsky destaca a sobrevivência de alguns diretores veteranos em meio às diretrizes pragmáticas dos dias que correm.

– Antigamente, os grandes cineastas eram marcas de confiança: Akira Kurosawa, Federico Fellini, François Truffaut, Jean-Luc Godard. Woody Allen e Roman Polanski estão entre as pouquíssimas grifes que sobraram – opina. – A distribuidora Estação fez, há alguns anos, um trabalho interessante lançando obras de Eric Rohmer. Deu certo, mas não sei como seria hoje.

Leon Cakoff, fundador da Filmes da Mostra e diretor da Mostra Internacional de São Paulo, é outro que lamenta a falta de apoio para lançar filmes independentes no país. A Filmes da Mostra comprou os direitos de O ncle boonmee who can recall hist past lives e deverá distribuílo ainda este ano. Será o primeiro longa de Apichatpong a estrear comercialmente no Brasil. Antes, o seu elogiado Síndromes e um século (2006) havia passado no Festival do Rio e São Paulo.

– Muitas pessoas reclamam, mas esquecem que está cada vez mais difícil distribuir filmes independentes no país – desabafa Cakoff.

– É algo que custa muito dinheiro. Existe um esforço de um lado, e do outro falta apoio e solidariedade do público e da imprensa.

Hoje o público não segue mais um diretor como acontecia antes.

Em todo caso, certas produções alcançam desempenho surpreendente quando lançadas em circuito.

Mademoiselle Chambon (2009) está indo muito bem, melhor no Rio de Janeiro que em São Paulo – avalia Shatovsky. – E o público descobriu Mother (2009), de Joon-ho Bong.

Distribuidores lamentam que o público não siga mais os diretores como no passado

Nomes prestigiados como os de Manoel de Oliveira e Lucrecia Martel não são suficientes para garantir estreias.



Nenhum comentário: